quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Brevis.

Essa multidão de esbaforidos pelos metrôs, ônibus, ruas, lojas, shoppings... à que se prestará? Mais uma vez, meus caros, às festas! Nossas confraternizações. De fato deve ser algo muito fraterno dar e receber presentes. Quem sabe... Porém, talvez o fim esteja mesmo no prazer das compras, nas comemorações e em mais um momento de esquecimento das mazelas do ano (ultra)passado. Mas quem seria o inconveniente que deitaria dúvidas nas supostas motivações de final de ano? Deixo isso para alguém mais corajoso ou "chato" do que eu. De minha parte, prefiro pensar no lado realmente importante dessa nossa transitoriedade. De nossa passagem pelo maior espetáculo do qual todos os canalhas, todos os honoráveis, todos os vilões e todos os heróis tiveram o fantástico privilégio de participar: a VIDA. Ainda há pouco me lembrava da esperança ardorosa, em menino, de ver algum dia a "passagem do ano". Queria tanto não dormir pra viver o momento exato em que um (ano) morria e o outro nascia. Confesso que me senti frustrado quando, finalmente, consegui manter-me acordado e vi apenas alguns adultos gritando. "Cadê?", perguntava pra mim mesmo. Tempos depois percebi que, talvez, essa era uma das grandes decepções que nós carregamos: é mentira, o ano nunca passa. Foi mais ou menos por esse tempo que pensei também em qual e como terá sido o momento exato em que, verdadeira e profundamente, tomamos consciência da nossa mortalidade. De que estamos morrendo agora. Hoje reflito no motivo pelo qual esse atino é prontamente apagado de nossas mentes.
Por que fugimos dessa verdade insofismável? Com certeza isso terá sido mais atordoante que minha descoberta de fim de ano. Muito mais marcante. No entanto, essas percepções todas me parecem insignificantes quando reflito no quanto custamos a chegar aqui. Decênios, milênios, ou lá o que for. Este momento, quer dizer, qualquer instante, deveria ser sagrado e cultuado todos os dias. Não direi "todo o tempo" para não corrermos o risco de sermos fundamentalistas de nós mesmos. Pense comigo: o que deveria realmente nos assombrar se não a nossa vez nesse imenso banquete? Talvez a morte, como um fato vindouro, transforme a vida em algo espantoso. Mas ela, nossa morte, sempre esteve aí. Bem antes de nós. Já nossas vidas...
Se eu não fosse "eu", o que, então, seria? Apenas "serei" por alguns breves momentos lançados nesse universo infinito: minha insignificante existência, minha consciência disso, minha inconsciência de tanto mais, minha aconsciência do que eu puder. E quantos anos eu poderei vir a ter? Cem? Pois isso é nada. Uma fagulha no gigantismo que é a insignificante história humana frente ao cosmos. Imagino a resposta de um senhor centenário, quanto a sua percepção da vida... "passa muito depressa: foi hoje de manhã, quando sugava as doces mamas, embalado pela cantiga de mamãe"... A grandiosidade, meus bebês (e somos todos nenéns), é a VIDA como fato! É ter acertado em cheio nessa loteria: fomos sorteados com o prêmio dos prêmios. E, ainda bem, não ganhamos sozinhos. Estamos todos nesse momento particular, participando da festa das dores, dos prazeres, dos temores, dos amores, das alegrias e das saudades. Das saudades deles, os que se foram mais cedo da nossa farra-existencial, que também estiveram aqui e que, de alguma forma, ainda estão. Pode duvidar. Mas creia... Creia!
Então, o que falar de todo esse, digamos, desespero? Pra mim, seria bom, em algum momento de toda essa tontice, percebermos que não é o ano quem passa. Somos nós. E, mais ainda, não é ele quem renasce, também somos nós. Talvez seja uma surpresa soberba descobrirmos que podemos nos embriagar ou delirar dessa obviedade que é percebermos o hedonismo da vida: corpo belo, mente sã e alma livre. Pagã! Estamos vivos, e isso é muito. Por ora é tudo. Mas, pra termos um denominador comum, sabe, o que eu queria dizer mesmo, enquanto ouço as cantatas de J.S. Bach (atemporais), era: FELIZ ANO NOVO!


Luiz Galdino de Santana.

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